segunda-feira
quinta-feira
Lendo, pelo fim do mundo
Lendo, pelo fim do mundo, a aventura de Miguel, cineasta chileno, absolutamente proibido de regressar ao seu país na era Pinochet e mesmo assim regressando, maquiado e travestido de burguês uruguaio, e encontrando, em Santiago, palco de mais de 40 mil mortos, 2 mil desaparecidos e 1 milhão de exilados, uma cidade também maquiada, ostentando um "brilho material com que a ditadura tratava de apagar o rastro sangrento". Lembrando da descoberta de pertences do pai de Marcelo Rubens Paiva, há poucos meses, em casa de um general brasileiro. E nunca esquecendo que um dos melhores do mundo é o escritor que chamam carinhosamente de Gabo: Gabriel García Marquez .
quarta-feira
camerata
Eu chegava na cidade,
depois de andanças. Ainda de corpo, que as outras partes sobrevoavam. Mas eu
vinha.
E escutei o chamado: quer participar do musical que estamos fazendo
sobre o Gainsbourg?
Quer, Eli?
‘Quero’ foi o que
disse, ainda na popa, pouco sabendo se desceria devagar ou aos saltos. Aos
saltos e devagar, desse jeito seria, é.
Até para o ‘quero’ vi que descia um
pouco mais, para tocar os pés.
Eles já pisavam.
Eu vim ao mundo para ser eu. Eu
vim para ser eu. Vim para ser.
A javanesa me esperava. Quando nos juntamos, a
Cínthya e eu, para fazer a versão em português, o que faltava para eu me aproximar
de mim desapareceu. Contamos os versos, observamos as rimas e quisemos
aliterar, como ela diz, e soa tão bem: a-li-te-rar. Gosto da palavra e não
quero procurar seu significado. Sei o que é, mesmo não sabendo.
Aprendi a nossa
Javanesa um pouco, nos ensaios. E vou aprendendo a cada vez que tenho o
microfone nas mãos.
É no meio da canção que sei que o que estou fazendo é eu. Nos
primeiros compassos, e depois, neste momento justo (e não há outra palavra para
dizê-lo: é neste momento justo) em que não canto, pendo a cabeça, me deixo,
sozinha, entrar no pulso do meu coração, e inspiro para dar a próxima nota, é
aí que vou sonhando, e existindo, e tendo de mim o melhor que quero.
Sou esta.
sábado
prumo
pru= voltar, sempre voltar
mo = alcançar
pru = descansar
mo = não julgar
mo = alcançar
pru = descansar
mo = não julgar
pru = contemplar
mo = sossegar
pru = contemplar sem julgamento
mo = conversar com o vento
pru = inspirar
mo = entoar
pru = expirar
mo = entoar
pru = imitar o vento
mo = estar
pru = ser
mo = ser
pru = ser
mo = ser
mo = sossegar
pru = contemplar sem julgamento
mo = conversar com o vento
pru = inspirar
mo = entoar
pru = expirar
mo = entoar
pru = imitar o vento
mo = estar
pru = ser
mo = ser
pru = ser
mo = ser
terça-feira
segunda-feira
o guapuruvu
como fazer de seu jotacá uma cabana na floresta - tomo 16
Naquela noite, a garota e seu partner voltaram do bar na carona do caminhão da Coca-cola. Madrugada, pouca gente, ela sabia dirigir, mas não tinha carro. Ele tinha carro à disposição, mas ainda iniciante na autoescola, não andava no corcel de noite. E como os pais dela não gostavam da filha cantando em bar da Cidade Baixa, não emprestavam a belina. Sentaram nos engradados, ele segurando o violão, e os bolsos forrados do couvert artístico - coisa de três pila por cabeça, que o violonista e a cantora crooner dividiam a 1,50 para cada um, houvesse só um vivente no bar assistindo, era isso que cada um levava pra casa. Havia poucos bares de música ao vivo na cidade, do tipo voz e violão. O Cokeru´s era de um argentino que dera por aí com os cornos, saído sabe-se lá de quê. De vez em quando, ele pedia que a gente fizesse Alfonsina. E a gente fazia. Cantava junto, o argenta. A garota de 19 anos atraiu muitos amigos seus e de seus amigos para o estabelecimento em frente ao Pão dos Pobres. Ovelha negra, da Rita Lee, não podia faltar. Era inverno. Ela gostava de usar o blusão tricotado pela irmã, todo colorido. Cabelo curto, pegava o microfone de madeira, isso mesmo, de madeira!, olhava bem pra ele. E cantava noite afora.
domingo
Como fazer de seu jotacá uma cabana na floresta - tomo 16
Foi por literatura que não me afundei no teu pescoço e morri na gola da tua camisa, foi por amor a Mário, Carlos, Julio, Clarice (os amores possíveis), foi por letras de Renato, por páginas de Florbela, por sussurros de Gullar, esse meu nobre pobre amigo de agosto, foi pelo mês de agosto que não sucumbi a teu rosto pequeno mas teu rosto no canto da tela - ausência tua, bastava uma tecla minha. Foi por literatura, por essas infâmias, foi por nossas estranhas maneiras de comportamento, foi por um belo instrumento de fala, foi porque tenho agora a fala rala, porque hoje não é novembro, porque chove, porque parou de chover, porque na foto o céu é sempre azul e liso engomado no ferro a vapor, que literatura, que palavras duras chegando a pontos finais, o ponto marcado, o encontro. Foi por querer Hilst e dormir com Andrade, acordar suada, os tapetes peludos e a cara aberta do Ferreira no retrato, foi por te amar de quatro, por feder a minha blusa e por não saber mais (perdendo os traços de Beatriz) como é o beijo do teu beijo que tocou minha boca que beijou a tua e te deu o beijo. Foi por literatura, pelo capítulo sete, foi pela esquina de nazca com aquela outra, foi porque pensei e se eu tivesse ido com o garçom do restaurante ao lado do teu prédio naquela tardezinha?, ah, foi por literatura, vai, porque era teu o sorriso irônica a covinha o doce dentro do ouvido fazendo perfume na praça, foi por correr nua ao lado do cavalo que soltaste das correntes aos dois graus e meio, a tevê ligada, a senhora chorando na portaria, os casais entrando contentes, mais contentes ainda saíam, foi pelos hífens que eliminaram da ortografia, pelos sanduíches de miga no Rivadavia, pelas migalhas que se produzem entre a noite e o dia, pelas tardes de trem, preguiça, uma poltrona aberta com o teu corpo dentro, teus olhos voltados pro firmamento, uma porta arrancada, às pressas, teus vazios na escada, a massa morta de mim ao lado do gato, os berros de que não fui eu, a esteira, (Bersuit nos alto-falantes anunciava a partida, minha, para a terra, de ninguém, no acaso. Ia, pelo bem).
[Para ler com voz de Elisa Lucinda ou pedir pra ela ler, se chegar perto]
[Para ler com voz de Elisa Lucinda ou pedir pra ela ler, se chegar perto]
sábado
quinta-feira
sexta-feira
papel aceita tudo
“Continuo te amando”, ia escrito no visor do celular. “Continuo te
amando”, solto, sem ponto final.
Viver amando é outra coisa. Continuar amando são outros quinhentos.
Escrever é só escrever, o papel (o visor) aceita tudo, disse um dia lá
perdido nos anos alguém a quem ela amou tresloucada, lembrando dele e
esquecendo de si. Lembrar dele e esquecer de si: que forma de amor é esta? Amor
às coisas da pessoa, seu respiro, amar quando se agacha para pegar uma chave
que caiu no tapete, quando se barbeia, quando sai e bate a porta furioso, volta
dois dias depois, detonado, camuflado, travado, rendido, sujo.
Será ela é a maior amadora no amor?
Por que pensa que é a melhor que ama?
Teve homenagem em pedra, e se vão anos: na parede de uma curva no centro da cidade, gravou ele o emblema que construíra em madeira como pingente para o colar. Gravou a piche, as iniciais dos dois. Por muito tempo, ficou ali, a história que nenhum jato de lavagem industrial conseguia eliminar. Emblemas não se lavam.
Teve homenagem em pedra, e se vão anos: na parede de uma curva no centro da cidade, gravou ele o emblema que construíra em madeira como pingente para o colar. Gravou a piche, as iniciais dos dois. Por muito tempo, ficou ali, a história que nenhum jato de lavagem industrial conseguia eliminar. Emblemas não se lavam.
Já o amor... é só abrir a torneira, a água que for irá desmanchar o
amor.
Amar com a boca escancarada, mostrando todos os dentes, é o maior perigo de toda a vida. O maior mistério, a vida mesma, ali, acontecendo, e não há recuo. Ao saltar no precipício, em pleno voo se lança a pessoa, desesperada, balançando as pernas no ar. Não existe "ah, não brinco mais", o desfiladeiro é real, pode encolher o corpo, baixar a cabeça para não ver, no entanto, e ademais, todavia, nevertheless... vai se perder de si. O inevitável. O ininventável.
Ninguém aguenta tanta liberdade. Entretanto, quase toda a gente aguenta, se viva. O amor é o salto no abismo, não o esborracho lá em baixo.
O esborracho é provável, mas se souber e quiser levantar o voo, e seguir no firme aumento de sua vida, poderá adiar. O esborracho.
Que vida não se adia.
Amar com a boca escancarada, mostrando todos os dentes, é o maior perigo de toda a vida. O maior mistério, a vida mesma, ali, acontecendo, e não há recuo. Ao saltar no precipício, em pleno voo se lança a pessoa, desesperada, balançando as pernas no ar. Não existe "ah, não brinco mais", o desfiladeiro é real, pode encolher o corpo, baixar a cabeça para não ver, no entanto, e ademais, todavia, nevertheless... vai se perder de si. O inevitável. O ininventável.
Ninguém aguenta tanta liberdade. Entretanto, quase toda a gente aguenta, se viva. O amor é o salto no abismo, não o esborracho lá em baixo.
O esborracho é provável, mas se souber e quiser levantar o voo, e seguir no firme aumento de sua vida, poderá adiar. O esborracho.
Que vida não se adia.
sábado
terça-feira
Uma nova vez da vida na pessoa
Fernando Pessoa in Eros e psique
Ele vem seguro
E vencendo estrada e muro chega onde em sonho ela mora.
Inda tonto do que houvera, a cabeça em maresia,
Ergue a mão, encontra a hera
E vê que ele mesmo era
A princesa que dormia.
E vencendo estrada e muro chega onde em sonho ela mora.
Inda tonto do que houvera, a cabeça em maresia,
Ergue a mão, encontra a hera
E vê que ele mesmo era
A princesa que dormia.
sábado
her taste of adventure is not exhausted
they say it's the way you wear your hat
i say it's the mind you have on at
they say it's me, my style, my tos and fros
i say it's the weather, the blues, the wooes
they say your pajamas were cute
i say your flavors are absolute
and so we go on saying this and that
till we cannot stop
and the night becomes a nightmare
full of reasonable thoughts
not until i won't be able to sleep
i'll watch you in deep
in your dos and dids
aos pés
Estivemos aos nossos
pés, ensolaradas. Ela e eu, depois de andar no píer. De saída de banho azul
turquesa, sapatinhos de moleca; eu, de havaianas e o biquíni floreado, lavara as pernas na beira. No mar, não tem mal nenhum. O que tem, as ondas levam. E
quando trazem de volta o mal, se é que o mal vem junto, já não estamos
mais ali. Ele nos salva, a todo instante. É o itinerante que nunca desiste.
Escreveu a linda Cínthya Verri: “se o mar pudesse acenar/ele nunca voltaria”.
quinta-feira
so long, gregory
Você, que tantos
desuniu, pois enquanto alguns afirmaram não perder um episódio de sua série,
outros mentiam dizendo que não gostavam de você. E há, é claro, os que
simplesmente o ignoraram.
Você, que foi capaz de
pôr sedativo no café de seu melhor amigo para injetar nele a primeira dose de
quimioterapia sem que ele concordasse, só porque precisava dele por mais tempo
vivo.
Você, que tirou o
respirador da boca de um paciente em agonia, para que ele confessasse uma
verdade de que você suspeitava, e assim pudesse curá-lo, segundo seus delírios
e prepotência. Sim, naquele episódio, você o curou.
Você, que foi
planejado pela TV norteamericana, mas é um inglês, e por isso posso dizer que o
adoro.
Você, House, por quem
me apaixonei perdidamente, mais do que por Marcos Paulo na telenovela
Carinhoso, mais do que pelo Capitão Nascimento em Tropa de Elite 2 ou Andy
Garcia em Modigliani, mais do que por Jorge Aragão e sua banda tocando a Ária
da Corda Sol ou o personagem sueco de A Delicadeza do Amor.
Bom, quanto ao Andy
Garcia... everybody lies.
Você! Que pica uma
bolinha no chão do consultório enquanto tenta encontrar um diagnóstico para uma
criança moribunda.
Você, que chega em
casa às cinco da manhã do hospital, senta no piano e toca “I’m sentimental/so I
walk in the rain...”
Você, que manda sua
equipe arrombar a casa do paciente usando os conhecimentos de ex-marginal de um
de seus médicos, para que descubra na rotina do doente algo que possa
solucionar o que parece insolúvel.
Você, que é o
contrário da letra de My Way, embora pareça ser seu sinônimo.
Você, Greg, viciado em
vicodine, que tem um buraco na perna e manca como Carlitos mancaria se fosse
manco.
Você, que afirma ser a
pessoa mais perturbada do mundo.
Você, que disse a
Cuddy: “Eu fiz coisas horríveis para você. E vou fazer de novo. E então, você
vai ver que eu não mudei.”
O homem a quem dá vontade de gritar: desumano!
Você, que não quer
evitar, que não pode evitar, ser quem é.
“My life is pain. It
has changed me. It made
me a harder person.”
Eu não sei como vai
ser minha vida sem você, House. Só sei como ela foi até agora.
quarta-feira
o urso, o gigante
"Eu me seguro em você e você em mim. Assim nenhum dos dois cai dessa altura. Depois giramos." E dançando sobre o abismo, o impasse entre o urso e o gigante foi resolvido com um simples abraço.
(Adaptado da postagem "A terceira margem do rio" do blog http://www.ecofuturo.org.br/premio/blog/show/753, sobre o livro A ponte, de Heinz Janisch e Helga Bansch, editora Brinque-Book.)
terça-feira
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